Muita gente já deve ter sentido um calafrio quando, de repente, se vê na borda de um precipício, ou num lugar muito alto.

É a conhecida vertigem das alturas. A pessoa sente-se, por assim dizer atraída pelo vazio.

Em sentido contrário, Deus pôs seres na natureza que parecem comprazer-se com as coisas altas, os grandes voos, os grandes horizontes, os grandes riscos. Vem-nos logo à mente as majestosas águias.

Pairando nas alturas, são capazes de distinguir pequenas presas e é o único animal capaz de fitar o sol.

Santo Agostinho, Bispo de Hipona, Doutor da Igreja

Convido o caro internauta a acompanhar-me num voo… nas asas de uma águia. Não de uma águia qualquer: na águia de Hipona.

Título bem merecido pelo grande Santo Agostinho, pois seus voos de alma são tais que — confesso — ao lê-lo pela primeira vez senti uma “vertigem”. Não de cair, mas de ver panoramas tão elevados que senti as “asas” pequenas para acompanhá-lo.

Em Santo Agostinho, não são só os voos causam “vertigem”. Os aparentes paradoxos a que ele recorre têm um efeito parecido.

Julgue você mesmo no trecho abaixo transcrito. É tirado de uma homilia em que o Santo considera os aparentes paradoxos a que Deus Filho quis submeter-se para salvar-nos.

“O Criador do ser humano se fez homem para que, Aquele que governa o Universo se alimentasse de leite,
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para que o Pão tivesse fome,
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para que a Fonte tivesse sede,
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para que a Luz adormecesse,
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o Caminho se fatigasse na viagem,
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a Verdade fosse acusada por falsos testemunhos,
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o Juiz dos vivos e dos mortos fosse julgado por um juiz mortal,
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o Cacho de Uvas fosse coroado de espinhos,
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o Alicerce fosse pendurado no madeiro;
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para que a Força se enfraquecesse,
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a Saúde fosse ferida e morresse a própria Vida”.> (*)
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(*) Santo Agostinho, Obras completas – Sermones , homilia 191,1 – Biblioteca de Autores Cristianos, Madrid, 1964.