Uma das características mais salientes do brasileiro, especialmente ao ver de outros povos, é a bondade, o afeto e… o jeitinho.

É típico dessa bondade e desse afeto o qualificar um dos exponenciais de nossa arte com um apelido, que, não fosse o diminutivo, pareceria uma ofensa: o Aleijadinho.

Este ano de 2014, coincidindo com o segundo centenário de sua morte, os Arautos do Evangelho de várias partes do Brasil — e do mundo — tiveram a alegria de conhecer de perto as obras desse genial escultor.

Nasceu o nosso gênio da escultura — e em muito da arquitetura — no pleno auge do ciclo do ouro, em 1738. Basta considerar, que só de Vila Rica (atual Ouro Preto) neste período retirou-se mais ouro que em dois séculos no mundo inteiro!

A piedade e o bom senso dos contemporâneos quiseram, de algum modo, agradecer ao Criador, erigindo templos que até hoje enchem de admiração quem percorre este trecho da Estrada Real: são as soberbas igrejas de Mariana, Sabará, são João del Rey, Diamantina e, evidentemente Vila Rica de Nossa Senhora do Pilar (era este o nome da atual Ouro Preto).

Chama a atenção no Aleijadinho o fato de ter sido praticamente autodidata, pois além da influência do pai, arquiteto de várias igrejas famosas, não recebeu praticamente educação formal na arte nem conheceu os monumentos europeus.

Arautos e aspirantes em visita ao Profetas do Aleijadinho

Apesar disso, um estudioso francês atual, conservador do Museu do Louvre não hesita em afirmar sobre a obra máxima do Aleijadinho: “o arrebatamento da inspiração barroca domina os profetas de Congonhas, fazendo sobressair os seus gestos na tela azul do céu impassível de Minas Gerais. Um sopro mais profundo anima-os, porém, um instinto que dá ao estilo oratório do barroco uma força de convicção retirada da fé das antigas idades”. (1)

As fontes documentais sobre a vida do Aleijadinho são poucas, mas no dizer dos estudiosos de sua arte, a fisionomia dele está registrada em suas numerosas obras, quer escultóricas, quer arquitetônicas. Os portais e púlpitos de inúmeras igrejas, mas, sobretudo, os Profetas no adro da Igreja de Bom Jesus dos Matosinhos, em Congonhas do Campo bem o “retratam”.

Um dos poucos retratos em pintura do Aleijadinho feito por um seu contemporâneo
Ele já estava tomado pela lepra

Em grande parte, Aleijadinho deve a sua glória “aos mundialmente célebres profetas esculpidos em pedra–sabão. Diante do edifício figuram reunidos doze enviados de Deus, como que saídos das páginas do Antigo Testamento, a proclamar vaticínios ao povo eleito e prepará-lo para a chegada do Redentor. Essas esculturas são fruto de uma inspiração tão magnífica, encarnam com tal esplendor a missão conferida pelo Senhor aos seus escolhidos, que ocupam um lugar ímpar no gênero”. (2)

Talhar semelhantes fisionomias, gestos e harmoniosas linhas nos pórticos só podem provir de uma alma penetrada pela fé e dotada por Deus de um gênio. Já houve quem afirmasse que a multiplicidade e o fino senso estético do Aleijadinho não ficam a dever, no seu campo, ao que foi a obra musical de Mozart.

A mais antiga biografia do Aleijadinho o descreve como um homem robusto e jovial, grande apreciador de uma boa mesa. Seu único retrato porém já o pinta na fase que adiante falamos.

ALGO QUE TORNA ALEIJADINHO AINDA MAIS ADMIRÁVEL

Aleijadinho viveu 76 anos, mas muitas de suas obras, ele as realizou após ter ficado leproso, aos 39 anos de idade. Ou seja, nos seus últimos 37 anos — época em que se situam várias de suas obras mais magnificas — ele as realizou sob o signo da dor, como Jesus, o seu Divino Inspirador.

Foi ele perdendo sucessivamente os dedos das mãos, parte dos movimentos, e teve a face desfigurada. Seus dois últimos anos ele os passou cego e paralisado no leito. No dia 14 de novembro de 1814, assistido por todos os Sacramentos, entregou sua alma ao Criador.

(1)BAZIN, Germain. O Aleijadinho e a escultura barroca no Brasil. São Paulo-Rio de Janeiro, Ed.Record, 1971, p.296.

(2) Ir. Carmela Werner Ferreira, EP, “Aleijadinho: dois séculos de arte e fé” na revista “Arautos do Evangelho”, nº 200, de outubro de 2014. Esse artigo aprofunda e dá muitos outros aspectos úteis para os queiram conhecer melhor o Aleijadinho. Para acessar o exemplar do corrente mês clique aqui )

Ilustrações: Arautos do Evangelho, Gustavo Krajl, Vitor Toniolo