Assim como não é possível separar dois lados de uma moeda, ou o calor do fogo, assim também há dois amores inseparáveis na alma de todo católico digno deste nome: o amor a Deus e o amor à Igreja.

O próprio Nosso Senhor estabelece esta unidade de dois amores num só, ao perguntar a São Pedro, o primeiro Papa: “Pedro tu me amas?”. Ante a resposta afirmativa, Jesus acrescenta, como quem quer uma prova deste amor: “Apascenta as minhas ovelhas”.

Como vê este amor uma grande santa?

Em concreto, Santa Teresa de Jesus, um dos pilares da reforma da Igreja no século XVI, grande mística, cujas obras escritas maravilham os entendidos dos séculos posteriores.

Santa Teresa de Jesus
Pintura contemporânea à Santa

O puro amor a Deus

Uma poesia, conhecida como “a poesia do puro amor de Deus” nos dá o quilate desta alma de fogo:

#Não me move meu Deus para amar-vos
o Céu que me tendes prometido;
nem me move o inferno tão temido
para deixar por isso de ofender-te

Move-me tu, Senhor, move-me ver-te
cravado nessa cruz e escarnecido
move-me ver teu corpo tão ferido;
move-me as afrontas que sofrestes e tua morte.

Move-me, por fim, teu amor, e de tal maneira
que, ainda que no houvesse Céu eu te amaria,
e, ainda que não houvesse inferno, te temeria.

Não tendes que me dar porque te ame,
pois, ainda que o que espero não esperasse,
o tanto que te amo, te amaria.#

O amor à Igreja

Santa Teresa tinha inseparável do amor a Deus o amor devido à Igreja. A teologia chama a Santa Igreja “a esposa mística de Cristo”. Dai vem o ardor com que pede a Deus:

#“Pai Santo, que estais nos Céus, não sois desagradecido para que pense eu que deixareis de fazer o que Vos suplicamos, para a honra de vosso Filho.

Não por nós, Senhor, que não o merecemos, mas pelo Sangue de vosso Filho e por seus merecimentos, e os de sua Mãe gloriosa, e os de tantos Mártires e Santos que morreram por Vós.

Ó Pai eterno! Vede que não se podem esquecer tantos açoites e injúrias e tão gravíssimos tormentos. Pois, Criador meu, como podem entranhas tão amorosas como as vossas sofrer que seja tido em tão pouca conta o que se fez com tão ardente amor de vosso Filho?

O mundo está pegando fogo, querem tornar a sentenciar a Cristo; pretendem demolir a sua Igreja: desmantelados os templos, perdidas tantas almas, abolidos os Sacramentos.

Pois que é isto, meu Senhor e meu Deus? Ou dai fim ao mundo, ou remediai tão gravíssimos males, que não há coração que o sofra, mesmo os nossos, que somos tão ruins.

Suplico-Vos, pois, Pai Eterno, que não o sofrais já Vós: atalhai este fogo, Senhor, pois se quereis, podeis; algum meio há de haver, Senhor meu: aplique-o vossa Majestade.

Tende pena de tantas almas que se perdem, e favorecei vossa Igreja. Não permitais ainda mais danos à Cristandade.

Senhor, dai já luz a estas trevas. Já, Senhor! Fazei que sossegue este mar; não ande sempre em tanta tempestade esta nave da Igreja. E salvai-nos, Senhor meu, que perecemos”.#

Peçamos a Nossa Senhora, Mãe da Igreja, que nos obtenha este duplo amor que se funde num só.

[Vide: Obras Completas de Santa Teresa de Jesus, Ed. Loyola, São Paulo, 1995]